TransArquitetura
Para Jorge Varella Maltz

Trans - Arquitetura
Desenho arquitetônico por Anthony Rafes


Centro de Cura, Monitoramento e Reflorestamento, com extensão em Nova York
TRANSARQUITETURA - BRASIL

Centro de Cura / Monitoramento / Reflorestamento Trans-arquitetura a ser construído em Mato Grosso do Sul com uma extensão de arte pública para Nova York/ Berlin. Projeto Público Específico de Arte e Arquitetura. (Em processo)

Descrição do Projeto:

TransArquitetura NYC / Berlin Extension é um projeto de arte pública transnacional que busca apoiar ativamente a resistência indígena contra a destruição da floresta e seus ecossistemas por corporações multinacionais. Acreditamos que as culturas e conhecimentos indígenas são fundamentais aos ecossistemas florestais e uma grande e importante força para a nossa saúde e sobrevivência.

Ataques violentos do governo, de fazendeiros e milícias privadas contra comunidades indígenas na região de Mato Grosso do Sul são uma das principais táticas que esses governantes e corporações com interesses monetarios estão perseguindo aos indigenas a fim de roubarem seus territorios e abrirem estes para a exploração, especialmente para mineração, extração de madeira, agricultura e gado.

Se as comunidades indígenas nao conseguirem resistir, não haverá nada para retardar a transição da floresta para as mãos das corporações. Noticias continuam a surgir diariamente sobre líderes de comunidades indígenas e ativistas sendo assassinados, comunidades inteiras sao aterrorizadas e recursos indígenas essenciais como água, peixes e solo estao sendo envenenados.

Em nossas conversas contínua e substancial com grupos e líderes indígenas (Guarani-Kaiowa e outros), compreendemos o estrago catastrófico que esta violência está causando aos povos indígenas física, psicológica, cultural e espiritualmente.

No entanto, esta não é apenas uma violência genocida - é também uma missão suicida deste governo, que tem o potencial de acelerar as emissões globais de C02 e destruir uma fonte primária de biodiversidade global. A floresta é o maior sumidouro de C02 do planeta e uma importante fonte de oxigênio que todos respiramos. Às vezes referido como o pulmão da terra, sua destruição garante uma catástrofe climática em uma escala nunca antes vista.

O projeto de arte pública aqui descrito está comprometido com a imaginação e o desenvolvimento de centros autônomos de apoio e comunicação entre as comunidades indígenas de Mato Grosso do Sul e com o desenvolvimento de mecanismos de conscientização e solidariedade transnacionais que não dependam das vicissitudes dos meios de comunicação, que muitas vezes está ligada aos próprios interesses que estão destruindo a Floresta e seus povos. Na tradição de ajuda mútua, procuramos oferecer recursos e habilidades para tornar mais fácil para as comunidades indígenas proteger e representar suas lutas e vidas de forma direta e autônoma.

Para este fim,

A transArquitetura consiste em três elementos centrais:

. Centro de Recuperação e Reflorestamento Comunitário de Dourados, Mato Grosso do Sul

. Protótipo de Centros de Monitoramento de Dourados, Mato Grosso do Sul

. Extensão NYC / Berlin que atuará como um meio direto de comunicação das comunidades indígenas com as pessoas e comunidades além das fronteiras do Brasil.

ESTÁGIO UM

Centro de cura e reflorestamento comunitário Localizada em Dourados, Mato Grosso do Sul

Materiais: Madeira, vinhas, materiais vegetais locais, etc.Os entalhes nas estruturas facilitam a montagem usando práticas e técnicas locais.

Projeto de Arquitetura dos Indígenas Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul

com apoio financeiro da campanha da banda de metal Gojira [2021]

casa de cura Guarani Kaiowa.jpg

video clip:

https://www.youtube.com/watch?v=B4CcX720DW4

Campanha:

https://www.youtube.com/watch?v=QDPDJ7AcpZ8

https://www.youtube.com/watch?v=ncYDrez3xew&t=1s

https://vimeo.com/588161290

  https://www.gojira-music.com/amazonia?ref=https://www.google.com/

ESTÁGIO DOIS

(Localizada em Mato Grosso do Sul (Guarani Kaiowa)

Centros protótipo de monitoramento

Deve-se enfatizar que os centros de monitoramento serão administrados e mantidos pelas próprias comunidades Guarani Kaiowa - este não é um monitoramento externo da floresta, mas um processo interno autônomo. Nosso papel é entregar os equipamentos, trazer pessoas com conhecimento tecnológico para ajudar a montar o laboratório de vigilância, ajudar a instalar câmeras em locais importantes ao longo de estradas florestais e rios e treinar membros da comunidade no uso e manutenção do equipamento.

Uma vez que os Centros de Monitoramento estejam funcionando, as aldeias podem usar as informações para auxiliar em suas decisões internas. Os Protótipos do Centros de Monitoramento são a segunda etapa do projeto de TransArquitetura e estarão localizados em várias aldeias de Guarani Kaiowa no Mato Grosso, áreas que estão na linha de frente de atividades madeireiras ilegais, milicias violentas, agronegócios e desmatamento.

Essas áreas são vastas, tornando difícil para as comunidades indígenas locais acompanharem o que está acontecendo em seus territórios em tempo real. Os Centros de Monitoramento são concebidos para permitir o monitoramento em tempo real de terras e florestas indígenas pelas próprias comunidades indígenas.

Ao entregar, instalar e fornecer treinamento no uso de equipamentos como câmeras (foto e vídeo), drones, telefones celulares, computadores, telas, baterias manuais e dispositivos GPS, as comunidades podem estar alertas a invasões em tempo real por madeireiros ilegais , mineiros e milícias.

A ideia é que isso permita que as comunidades desenvolvam estratégias para resistir a tais incursões e, tão importante, mover as pessoas para locais mais seguros a fim de evitar a violência quando necessário. Os centros serão protótipos no sentido de que permitirão o desenvolvimento de habilidades e experiências que podem potencialmente ser levadas para além das aldeias iniciais.

A ideia de tais centros foi desenvolvida de forma colaborativa durante meses de conversação com líderes indígenas nessas áreas e reflete a necessidade de nivelar profundas disparidades entre o acesso à informação do que esta acontecendo nas aldeias. Eles também podem optar por compartilhar imagens ao vivo da floresta, da poluição, dos incêndios, de incursões ou de outras atividades e eventos da vila a seu próprio critério por meio da Extensão NYC / Berlim em tempo real

(veja abaixo).

ESTÁGIO TRÊS

Extensão NYC / Berlim

Localizado em um parque público de Nova York / Belin

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O Centro de Cura e Reflorestamento Comunitário

é a primeira dimensão arquitetônica do projeto de TransArquitetura e a ideia e ser construído em NYC como um local de apoio à saúde e cura comunal indígena. O estresse e a dor de suportar o atual ataque às suas culturas, corpos e estilo de vida não podem ser superestimados. Em conversas com líderes comunitários, ficou claro que manter a vontade de resistir e até de viver tornou-se de extrema importância para os indígenas. O Centro foi concebido para ser um local de refúgio, um local para imaginar e recarregar as energias, um local para armazenar com segurança artefatos e conhecimentos culturais e para praticar, desenvolver e trocar conhecimentos coletivos.

O Centro de Cura incluirá vários espaços separados, mas agrupados, que se concentram em diferentes práticas de cura e tem como objetivo colocar a cura da comunidade nas mãos da comunidade.

Os detalhes dessas práticas serão determinados pelas próprias comunidades, mas em conversas várias ideias possíveis já foram sugeridas, incluindo salas para: histórias orais e arquivos culturais; preparação e uso de conhecimentos de medicamentos fitoterápicos; trabalho energético e práticas somáticas; terapia de arte e projetos de arte comunitária (incluindo artes visuais, música, movimento e contação de histórias / danca e poesia); um banho comum; tratamentos e suporte para o abuso de substâncias; uma horta com cozinha e sala de jantar comuns; bem como um salão para reuniões públicas, planejamento e conversação.

Um componente central final do Centro de Cura será o desenvolvimento de técnicas de reflorestamento para áreas das florestas que foram destruídas. O design do Centro incorpora o estilo arquitetônico tradicional OCA indígena com tecnologias e materiais mais recentes, como painéis solares e isolamento. Também eleva o OCA até as árvores e os agrupa com passarelas e plataformas de conexão que funcionam para construir um espaço aberto semelhante a uma praça sob as estruturas que podem ser usadas para hortas, projetos de permacultura, preparação de reflorestamento e / ou reuniões.

A suspensão do Ocas é defensiva, pois garante que visitantes potencialmente hostis sejam visíveis. Mas também é esteticamente importante, na medida em que os espaços estão literalmente aninhados e rodeados por árvores, pássaros e vegetação, criando um ambiente de suspensão, paz e cura para o importante trabalho e descanso que aqui terá lugar. Os recursos de design e o conceito do centro de cura emergem de um projeto conceitual maior que envolve o desenvolvimento do que estou chamando de transarquitetura (veja mais sobre isso em TransArquitetura como Prática e Conceito abaixo).

TRANSARCHITECTURE NYC

TRANSARCHITECTURE NYC

NYC / Berlin Park Extension

A extensão NYC / Berlin foi concebida como um ponto de acesso para os grupos Guarani Kaiowa e para pessoas além das fronteiras do Brasil. Como tal, tem como objetivo atuar como uma ponte em tempo real entre as localidades, permitindo a auto-representação indígena em sua vida diária, e suas lutas para sobreviverem e os esforços que fazem para proteger a floresta e suas comunidades da exploração .

Conectando-se digitalmente aos Centros de Monitoramento e ao Centro de Cura Comunitária, as comunidades indígenas decidem por si mesmas quais transmissões desejam enviar para a Extensão NYC / Berlim (mensagens de vídeo diretas, imagens de invasões, encontros com madeireiros ilegais, atividades e eventos em aldeias, perspectivas culturais e conhecimentos, práticas medicinais, locais de incêndio e poluição, etc).

A Extensão tem como missão não só estimular a troca de experiências e campos do conhecimento, mas também fomentar o apoio ao reflorestamento, criando um diálogo contínuo com as comunidades artísticas, ativistas e ambientais tanto do Mato Grosso do Sul quanto de Nova York / Berlim .

Como tal, a Extensão NYC / Berlim pode ser vista não como um monumento ao genocídio de um povo (do passado), mas como um anti-monumento que visa impedir o genocidio no presente. A extensão transmite e documenta chamadas indígenas para tipos específicos de solidariedade e apoio translocal.

É uma ferramenta para a análise de crimes cometidos contra povos indígenas, é um mecanismo pelo qual as perspectivas indígenas sobre a saúde e sustentabilidade da floresta podem ser transmitidas e compartilhadas e é um potencial intimidador para as forças em territorio que estão praticando táticas ilegais .

Para os visitantes da Extensão, os encontros em tempo real criam consciência das perspectivas e experiências indígenas, sem os filtros do aparato midiático ou dos políticos. Em certo sentido, a Extensão é um convite para os nova-iorquinos responderem a solicitações indígenas específicas, para obter uma visão da complexidade e severidade do momento atual e, ao fazê-lo, para se tornarem, por meio do encontro e da resposta, guardiães colaborativos da floresta.

Adriana Varella,

site www.adrianavarella.net, = Trans media, Arte Pública, Artista Visual -

Centro de Cura / Monitoramento / Reflorestamento Transarquitetura a ser construído em Mato Grosso do Sul com extensão de arte pública para NYC / Berlim. Projeto Site Específico de Arte e Arquitetura. (Em processo)

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Demandas Sociais e Ambientais

Através do Projeto Arte da Transarquitetura -

Desterritorializando e Construindo Redes

TRANSARQUITETURA POR Natasha Marzliak

“Como seriam os espaços livres? Como seriam a arquitetura livre? Como se configurariam outras possibilidades de estar no mundo? Como seriam as relações?”. Com o objetivo de construir novos lugares de convivência, de relação inter-humana e com o mundo, a obra pública "Transarquitetura" (2020-em processo), da artista plástica Adriana Varella, com reflexão teórica da pesquisadora Natasha Marzliak, quer não só denunciar hegemônicos arquitetura, mas promovendo uma mudança efetiva. Em razão de demandas socioambientais urgentes, a proposta é romper com a arquitetura instituída com o objetivo de desterritorializar e construir redes. Este projeto começa a apoiar a vida indígena e a floresta no Brasil, mais precisamente os representantes dos Guarani-Kaiowá que vivem em Dourados, no Estado do Mato Grosso do Sul. Esses povos, cuja cultura, arte, conhecimento, como filosofia e cosmologia, foram silenciados desde a colonização, na verdade sofrem conflitos pela impossibilidade de frear a expansão territorial de grandes corporações, que investem na mineração, na indústria madeireira e no agronegócio, o que mobiliza um rede de invasores, de uma variedade de grandes fazendeiros a proprietários ilegais. O objetivo é apoiar a sobrevivência indígena e promover sua autonomia, bem como apoiar a resistência indígena contra a destruição das florestas e seus ecossistemas. A "Transarquitetura" é composta pela construção de duas estruturas interligadas: a primeira é um centro comunitário de cura, monitoramento e reflorestamento, localizado na aldeia Guarani-Kaiowá. Essa estrutura tem como funções promover reconfigurações vivas e saudáveis; esta, a partir do saber arquitetônico Guarani-Kaiowá, que foi silenciado pelos europeus, em um projeto genocida que remonta à colonização do século XVI; também fará o monitoramento da região contra invasores e fomentará a agricultura e reflorestamento local, corroborando com a sustentabilidade ambiental. A segunda estrutura é um centro de extensão em um parque público em NYC / Berlin, que implica formas independentes e transnacionais de comunicação, transmitindo conhecimento descolonial para povos e comunidades fora das fronteiras do Brasil.

O projeto “Transarquitetura” insere-se no contexto da arte contemporânea, transmídia, tecnológica, arquitetônica, ambiental, pública, ativista e colaborativa / relacional e seu discurso é baseado em uma metodologia descolonial e anarquista.

Num terreno fértil de muitas experimentações, alguns artistas da década de 1960 influenciados por Duchamp, os dadaístas e os surrealistas, retomaram o conceito de arte pública. Essa prática se opõe ao mercado de arte e aos espaços de arte institucionalizados, como os “cubos brancos” das galerias e os museus “sacralizados”, que, do ponto de vista da arte pública, isolam as manifestações artísticas do mundo real, como espaços de neutralização do poder da arte. A arte pública, que também pode ser referida como arte participativa, colaborativa ou relacional, implica privilegiar os processos da arte na promoção da relação com imagens, conduzindo a uma interação ainda mais ativa do público, razão pela qual se configura campo para artistas ativistas desenvolverem suas produções.

A arte ativista, por ser uma força de mudança, se opõe aos lugares da arte instituídos e sua ética é lançar luz sobre as demandas sociais e transformar espaços hegemônicos, linguagens, códigos e noções de tempo, além de formas tradicionais de pensar e relacionar. entre pessoas. Autores como Grant Kester (historiador da arte), Nicolas Bourriaud e Nato Thompson (curadores e críticos de arte), entendem que a ética de fomentar relações sociais emancipatórias só se estabelece se a obra de arte provocar a participação efetiva do público, que também se submeterá seu corpo para novos significados e, portanto, para novos pensamentos. A arte pública em sua interface com a arte ativista toca as pessoas com mais facilidade. Não há necessidade de ir a um museu ou galeria de arte para ver o que é comumente considerado "arte". A arte que acontece em espaços públicos é um instrumento substancial da arte ativista para fazer ver, sentir e pensar de forma diferente.

Para que isso aconteça, a arte ativista leva em consideração os processos de criação coletiva entre artistas e público, como o grupo que Adriana Varella ajudou a fundar e participa ativamente: ANARKOARTLAB (New York City). Esse coletivo, à luz do anarquismo, promove situações de reconfigurações da existência e da realidade na mistura de linguagens e na transdisciplinaridade, convocando a criação do público, que é coautor de experimentos artísticos. A criação coletiva permite trocas de saberes contra a ideia do artista como um gênio. Assim, a arte se dá em múltiplas perspectivas e não é mais um objeto sagrado e acabado, representativo, idealizado e portador de uma “mensagem”.

A “transarquitetura” se constrói nas relações entre arte e política, em uma perspectiva descolonial e no compartilhamento do sensível em busca da verdadeira igualdade, conforme conceituada por Jacques Rancière em 2000, ou seja, reconhecendo o diferente na construção da alteridade. Essa obra é revolucionária e não corrobora com a indústria cultural, já que Theodor Adorno criticou o mercado de arte na primeira metade do século 20 e, além disso, politiza a arte, à luz do também pensador da escola de Frankfurt, Walter Benjamin.

A ideia é utópica e tenso com os movimentos sociais, mais precisamente com as minorias indígenas do Brasil. Utopia porque quer romper com a história do norte global, reivindicando outra realidade. Aproximando-se da mudança possível, o imaginário utópico da “Transarquitetura” começa a tomar forma no imaginário coletivo das pessoas que colaboram com este projeto. Afinal, quais são os desejos, sonhos e demandas atuais das comunidades indígenas brasileiras, que insistem em sobreviver apesar dos ataques genocidas? A ideia aqui é que, em nossa utopia, nossos sonhos coletivos se organizem em ideias coerentes para legitimar e construir uma outra sociedade, que considere os saberes indígenas e rompa com a ordem dominante.

A “transarquitetura” parte da ideia de que a arquitetura é um espaço social ideológico, construído de acordo com o status quo do capitalismo branco-cis-hetero-patriarcal conservador que deve ser enfrentado: Sim, porque o que são casas, edifícios? São estruturas que moldam o modo como as pessoas interagem na sua vida real ...

Dentro da arquitectura de edifícios existem códigos e mensagens que nos condicionam, ou seja: arquitecturas são espaços ideológicos. (entrevistas com Adriana Varella por Natasha Marzliak, 2015-2019). comportamentos ", a desterritorialização é um convite à desordem, uma ruptura com o instituído.

A" transarquitetura "se opõe à arquitetura cis-hetero-patriarcal branca e também aos espaços de arte conformados e verticalizados e com interesse na construção de espaços livres e arte pública. Os espaços de arte tradicional não trazem mudanças, pois também fazem parte da estrutura opressora.

Segundo Adriana Varella: Para mim, fazer arte agora é seguir a realidade construída das vidas, pois é aí onde a arte está viva e pulsante em contraste com os espaços vazios, apáticos e sagrados-mitificados da arte contemporânea (museus, galerias, teatros, etc.) . Esses espaços seguros de arte fazem parte das estruturas patriarcais brancas e capitalistas. (entrevistas com Adriana Varella por Natasha Marzliak, 2015-2019).

A obra Transarquitetura desafia as relações entre espaço, corpo e poder na medida em que a arquitetura é um instrumento de dominação do patriarcado e do capitalismo e moldado pelo colonialismo, imperialismo e governo do Estado. Como sua primeira ação apoia a vida indígena e a floresta. Tudo começou em colaboração com mulheres indígenas representantes da etnia Guarani-Kaiowá, a segunda maior população indígena do Brasil. Moram na cidade de Dourados, no Estado de Mato Grosso do Sul, e sofrem conflitos pela impossibilidade de conter a expansão territorial do agronegócio, que mobiliza uma rede de invasores desde uma gama de grandes fazendeiros até proprietários ilegais.

O objetivo deste projeto é apoiar a sobrevivência dos índios e fomentar sua autonomia, bem como proteger as florestas, luta que os povos do Brasil vêm travando desde a invasão portuguesa em solo nacional em 1500. Os índios brasileiros eram considerados pelos Os europeus como "animais sem alma", um povo não civilizado. Depois de ser escravizada e passar por um processo de aculturação que remonta às ações das ordens jesuítas do século XVI, a violência persiste até os dias de hoje. Desde a construção da Transamazônica em 1971, durante a ditadura militar, os indígenas têm sido submetidos a um aumento da violência e à ameaça de um genocídio absoluto. Atualmente, grandes corporações, que investem em mineração, madeira e agronegócio, apoiadas pelo atual governo brasileiro, ameaçam vidas indígenas, florestas e seus ecossistemas. eles estão expostos, por exemplo, a pesticidas tóxicos da agricultura em grande escala. Com isso, perderam seus direitos à terra e suas vidas estão ameaçadas, assim como a saúde das florestas. Os espaços públicos são ideológicos porque estão impregnados de crenças que, por sua vez, são instrumentos de controle social. A construção das coisas no mundo, as interpretações, as representações, bem como as relações que delas emergem, são fruto de um determinado contexto - e de um agenciamento de poder.

Arquitetura e urbanismo constituem uma das maiores evidências do reino de ideias, valores e interesses que permeiam os objetivos sociais e políticos de uma sociedade. As construções e intervenções urbanas equivalem à ponta dos icebergs de intenções evidentes e ocultas, e jogos de poder, verdadeiros fetiches que expressam as ideologias dos diferentes grupos que pretendem assumir o controle social e urbano. (GHIONE, 2013, sem página)

No mundo ocidental, as arraigadas restrições ideológicas de razão e ordem, impostas pelo sistema capitalista, se refletem nos espaços comuns, padronizando ideias e comportamentos. Foucault, em sua pesquisa sobre como o corpo foi percebido e valorizado na história, diz que ele está completamente mergulhado na política e que "as relações de poder operam sobre ele de modo imediato; elas o investem, o marcam, o dirigem, o supliciam , submetem-no a trabalhos, obrigam-no a cerimônias, peg-lhe sinais ”(Foucault, 1987, p. 29). O corpo na sociedade é submetido à imposição de limites, proibições e interdições. Essas imposições nascem do ser humano relações e as instituições que delas decorrem São os micropoderes que perpassam e impõem regras de conduta ao corpo social, que repercute nos comportamentos e configura as relações de poder.

Se o território é um espaço material fundamental da cultura, um lugar de organização, segurança, racionalidade e "bem. Com isso, a cultura e o conhecimento indígenas foram silenciados durante séculos. É um processo de destruição dos povos indígenas do Brasil e de seus florestas, forjadas pela colonização europeia e, posteriormente, pelo capitalismo e imperialismo americanos. A cultura e o conhecimento indígenas são importantes para a manutenção dos ecossistemas, fonte primária da biodiversidade global. Desta forma, este projeto apoia a resistência indígena contra a destruição de florestas.

Por meio da colaboração e do diálogo com a comunidade Guarani-Kaiowá, a Transarquitetura opta pela descolonialidade; o projeto surge da perspectiva não só de Adriana Varella, mas da união de seu pensamento e visão de mundo com os dos povos indígenas, cujos corpos - e suas respectivas formas de ver e viver no mundo - foram humilhados, torturados (fisicamente e psicologicamente) e silenciada ao longo da história do colonialismo e da implementação do capitalismo no Brasil. A opção descolonial não desliga o conhecimento do norte global, mas faz jus às injustiças, humilhações e silenciamentos.

Felizmente, a opção descolonial concede a concepção de reprodução da vida que vem dos damnés, na terminologia de Frantz Fanon, ou seja, na perspectiva da maioria das pessoas no planeta cujas vidas foram declaradas dispensáveis, cuja dignidade foi humilhada, cujos corpos foram usados ​​como força de trabalho: aqui a reprodução da vida é um conceito que emerge dos escravos africanos e indígenas na formação de uma economia capitalista, e que se estende à reprodução da morte por meio da expansão imperial do Ocidente e do crescimento da economia capitalista. Esta é a opção descolonial que alimenta o pensamento descolonial ao imaginar um mundo no qual muitos mundos podem coexistir. (MIGNOLO, 2008, p. 296, tradução nossa)

Desde 2006, as mulheres Guarani e Kaiowá buscam se reunir e fortalecer sua resistência por meio da Kuñangue Aty Guasu - A Grande Assembleia das Mulheres Guarani e Kaiowá. A Associação Kuñangue Aty Guasu é liderada por mulheres Guarani & Kaiowá e Ñandesys (xamãs) e é um importante espaço de troca de informações, denúncias de violações de direitos humanos e desenvolvimento de propostas de resistência. A Associação Guarani-Kaiowá é um local de mobilizações políticas, bem como um local de fortalecimento espiritual de nossa comunidade. Na perspectiva ancestral dos índios Guarani-Kaiowá, as Ñandesys (xamãs) e as idosas são as guardiãs de seus conhecimentos, cosmologia, filosofia e cultura. Assim, são representantes da história da resistência Guarani e Kaoiwá, em posicionamentos contra o patriarcado dominante no Brasil.

A associação de mulheres da comunidade Guarani-Kaiowá está associada à “Articulação dos Povos Indígenas do Brasil - APIB”. A APIB é uma organização não governamental criada em 2005 pelo movimento indígena Camp Terra Livre, que é uma mobilização política que produz ações e manifestações indígenas em Brasília (capital do Brasil) todos os anos, tornando visível a situação dos direitos indígenas e exigindo que o Estado brasileiro atende às suas demandas. A APIB é uma instância de referência nacional do movimento indígena no Brasil. A organização é administrada por povos indígenas e apóia as associações indígenas regionais e nasceu com o objetivo de fortalecer a união dos povos de diferentes regiões do país contra as ameaças e agressões aos direitos indígenas. O projeto “Transarquitetura” é, portanto, também parceiro e colaborador da APIB.

O projeto pretende construir dois elementos centrais interligados: um centro comunitário de cura, monitoramento e reflorestamento, localizado na aldeia Guarani-Kaiowá; e um centro de extensão em NYC / Berlin que atuará como um meio direto de comunicação das comunidades indígenas com as pessoas e comunidades além das fronteiras do Brasil.

No centro localizado em Mato Grosso do Sul, os espaços são construídos com totens circulares interligados por pontes e plataformas que hibridizam os genitais masculino e feminino de forma que o que se deseja não é uma arquitetura matricial, ao contrário da patriarcal, pois destacar o feminino seria, ainda, reiterar a subdivisão binária do patriarcado. Na comunidade Guarani-Kaiowá, existe uma parcela significativa da população que é trans / queer e que não considera sua identidade conformada aos padrões impostos de divisão de gênero entre mulheres e homens. Portanto, esta forma arquitetônica visa acomodar todos os tipos de corpos e comportamentos individuais que coexistem no coletivo.

O formato circular das estruturas lembra o tradicional oco indígena (ocas) e tem a função de receber o coletivo. “Transarquitetura" visa reconfigurar a maneira como as pessoas vivem juntas, promovendo relações de igualdade entre todas as pessoas na aldeia, abrangendo a parcela de pessoas queer.

No espaço de cura, haverá espaços modulares com paredes móveis e plataformas para serem utilizadas conforme a necessidade: serão utilizadas para descanso, reuniões, jardins construídos e para as práticas de vida comunitária, como a manutenção da saúde física e mental indígena, por meio a preparação de medicamentos com plantas; arte-terapia e projetos envolvendo artes visuais, música, dança, poesia, contação de histórias, etc. Além disso, haverá um banheiro e uma cozinha coletiva. Além disso, logo abaixo das estruturas, haverá espaço para agricultura associada ao reflorestamento, corroborando a sustentabilidade ambiental.

O formato vertical tem a função de torná-lo alto o suficiente para que os indígenas acompanhem a aproximação dos invasores em seu território. Os espaços de monitoramento também contarão com um arsenal tecnológico. Adriana Varella esteve no Brasil em novembro de dois mil e vinte para trazer para a aldeia drones, computadores, binóculos noturnos e coletes à prova de balas, embora em quantidade não grande por falta de recursos financeiros. Esses dispositivos permitirão defesa e vigilância. Então, ao invés de serem supervisionados e invadidos, eles fiscalizam para prevenir invasões.

Vigilância é uma forma de controle de poder. O homem moderno passou por processos de subjetivação forjados por instituições do poder-estado e seus modos de arquitetura, como escolas, hospitais, prisões, igrejas, famílias (nucleares), que moldam o corpo para que não sejam desviantes. o caminho da racionalidade e da ordem. Foucault escreveu que essas instituições seguiram o modelo arquitetônico do panóptico, projeto prisional inventado por Jeremy Bentham em 1793, que se espalhou por diversas arquiteturas institucionais, sempre com o objetivo de controle social. Posteriormente, Bauman fala sobre o conceito de pós-panopticismo na sociedade atual, quando não há mais espaço físico e a percepção do sujeito do vigilante torna-se ainda mais difusa, mas o campo digital, por meio da Internet, também pode ser utilizado como um mecanismo de controle, como Big Data.

Em contraste com a arquitetura universal hegemônica, implantada no Brasil desde a colonização, que difere de nossas condições sociais e climáticas locais, o projeto "Transarquitetura" se preocupa em se adequar ao nosso meio, buscando assimilar as soluções arquitetônicas dos saberes indígenas para a construção desses espaços, como os modos de construir, suas técnicas e materiais, e os modos de ser, viver e conviver com os povos indígenas. A construção também inclui tecnologias não indígenas, mas sustentáveis, como painéis para captação de energia solar, alguns materiais de isolamento térmico, captação de água da chuva e moinhos de energia. Assim, rompe com a arquitetura da cultura ocidental e das conveniências capitalistas porque permite, além do monitoramento contra invasões genocidas, a criação de espaços de convivência não hierárquicos, autônomos, sustentáveis ​​e coletivos.

A “Transarquitetura" também pretende promover mecanismos de conscientização sobre a destruição da vida indígena e da floresta, implicando em formas de comunicação transnacional e transmissão do conhecimento descolonial para pessoas e comunidades além das fronteiras do Brasil. Dessa forma, o centro de extensão em NYC também Será feito na hibridização “totem-hollow” e de um espaço interno modular, mas utilizando materiais adequados ao ambiente local.Por meio da Internet, os indígenas no Brasil poderão se comunicar com os berlinenses por meio de programas de tradução da língua guarani para o inglês. Nessa comunicação, que não depende da comunicação de massa, as pessoas poderão trocar experiências e saberes. Os berlinenses poderão conhecer a história dos índios Guaranis-Kaiowá, sua língua, sua bioarquitetura, sua alimentação e a agroecologia, seus ofícios, seus rituais e o uso de recursos naturais para curar doenças. é também uma ferramenta de apoio aos povos indígenas e à floresta, estabelecendo um diálogo permanente entre indígenas, ativistas e comunidades científicas e artísticas. Os indígenas poderão enviar mensagens de voz e vídeo, filmagens de invasões, incêndios criminosos, além de atividades e encontros que acontecem na comunidade.

Como uma expansão desse projeto de comunicação, o desejo é criar, no futuro, pontos de transmissão não só entre a comunidade Guarani-Kaiowá e o centro de Berlim, mas também abrangendo outras aldeias indígenas em todo o território brasileiro e outras cidades do mundo. A relação entre a comunidade Guarani-Kaiowá no Brasil e o centro de extensão em Berlim é um protótipo que possibilitaria, no futuro, expandir o projeto com várias outras conexões entre povos do norte e do sul globais, em uma epistemologia descolonial.

A arquitetura, como disse, expressa o passado, suas crenças, ideologias e mecanismos de dominação. Separada do projeto de arquitetura universal, ocidental, patriarcal e capitalista, a "Transarquitetura" suspende o tempo. É decolonial e reescreve a história dos povos indígenas a partir de sua perspectiva. Rompe com as estruturas que, à luz da colonização e do imperialismo, silenciaram os seres, os lugares e os saberes dos indígenas brasileiros.

Além da arquitetura, esse antimonumento é veiculado pelas tecnologias de comunicação para os diálogos transnacionais, sendo um meio de ampliar essa nova ética que evidencia o conhecimento das bases epistemológicas do sul global, mais precisamente o saber indígena brasileiro. Esse conhecimento sai da zona periférica para assumir a sua importância de ser, saber, relacionar-se com o outro e com o mundo, agora numa perspectiva mais sustentável e longe dos laços do capitalismo.

Por fim, o projeto “Transarquitecture” corrobora o evento Driving the Human porque leva “a refletir sobre como sua proposta se alinha com noções de futuro sustentável e coletivo, renovação eco-social, bem como ideias de transdisciplinaridade e colaboração”. (https://drivingthehuman.com/application-guidelines/)

Natasha Marzliak

Natasha Marzliak é professora assistente da Universidade PUC-Campinas, no Estado de São Paulo, Brasil. É Doutora em Multimídia e Arte pela UNICAMP com estágio de doutorado em Cinema e Audiovisual pela Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne, Mestre em Cultura e Mídia Audiovisual pela UNICAMP e Bacharel em Artes Visuais pela UNICAMP. Como investigadora, através de um discurso da arte descolonial, tem vindo a estudar projetos contemporâneos que se encontram na intersecção do cinema, do vídeo, das novas tecnologias, da transmídia e da arte pública, ativista e colaborativa / relacional.

As modificações metodológicas da História e da Estética da Arte diante dos debates que a arte contemporânea traz, seguindo o universo híbrido de arte, novas mídias e tecnologia, é um campo do conhecimento que ela vem investigando desde o mestrado, quando cursou o Brasil. as instalações quase cinematográficas do artista plástico Hélio Oiticica, produzidas nos anos 1970, e as possibilidades dialógicas entre as experiências audiovisuais da pós-vanguarda e as práticas da videoinstalação contemporânea. Em sua pesquisa de doutorado, estudou as instalações audiovisuais dos artistas brasileiros André Parente, Katia Maciel, Adriana Varella e Kika Nicolela, por meio de diversas interfaces filosóficas, tendo em vista o cenário de constantes inovações e experimentações entre mídias que configuram a arte contemporânea. A sua formação académica abrangeu os mais diversos temas no estudo da produção artística desde os movimentos pós-vanguardistas das décadas de 1960 e 1970 até aos nossos dias, numa abordagem transdisciplinar. Publicou artigos importantes em revistas de alto impacto.